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O artigo homônimo publicado no Giro Boi do Canal Rural1 apresenta 10 princípios básicos para o manejo do gado. Começa “buscando uma referência”. “O que a gente tem que pensar é que esses animais têm milhares de anos que foram domesticados e por várias e vários anos eles foram guiados. E à medida que nós intensificamos os processos de criação, nós paramos de guiar e começamos a tocar. Mas o bovino quer ser guiado.”
Depois o artigo segue com os princípios: o gado quer ver o manejador (1); o boi vê melhor quem está em movimento (2); o gado responde melhor ao olhar (3); o gado gosta de passar ao redor do manejador (4); o boi gosta de retornar por onde veio (5); o boi processa uma informação de cada vez (6); trabalhar com pressão e alívio (7); respeitar o grupo (8); respeitar a hierarquia do rebanho (9) e trabalhar com calma (10).
Na semana passada, representantes de um coletivo de pessoas que têm, entre seus membros e coordenadores, mães que perderam a guarda de seus filhos e militam pela revogação da Lei 12.318/2010 que apelidaram de LAP tentaram convencer o Presidente da República de que a “lei 2010” incentiva o incesto. Em outra publicação afirmaram: Lei da alienação parental – Brasil conhecido no exterior como país que legalizou o incesto. Bolsonaro diz que desconhecia.
Esses coletivos têm, para além de alguns milhares de seguidores, escuta entre algumas parlamentares que chegaram a propor um projeto de lei (6.371/19) para revogar a Lei 12.318/2010 que protege as crianças e adolescentes da Alienação Parental. Pior que os seguidores de rede social as seguirem é o fato de parlamentares acreditarem nessas histórias sem checar os fatos, principalmente quando pensamos que as eleições de 2022 estão logo aí.
O Brasil não tem nenhuma lei proíba o incesto entre adultos, apesar da sua prática ser reprovada moral e religiosamente. O incesto, por definição é relação sexual entre parentes (consanguíneos ou afins) dentro dos graus em que a lei, a moral ou a religião proíbe ou condena o casamento.2 As relações incestuosas não podem resultar em casamentos ou uniões estáveis, mas não é crime. O que a lei brasileira criminaliza (e muito) é qualquer tipo de abuso sexual com crianças e adolescentes.
Nesse ponto os coletivos mostram profundo desconhecimento sobre o que falam. Os abusos sexuais contra crianças são crimes segundo o código penal (art. 217-A do CP – estupro de vulnerável; art. 218 do CP – mediação de menor de 14 anos para satisfazer a lascívia de outrem; art. 218-A do CP – satisfação da lascívia mediante a presença de menor de 14 anos; 218-B do CP – favorecimento da prostituição ou outra forma de exploração sexual de criança, adolescente ou vulnerável)3 e segundo a Lei 8.069/90, o Estatuto da Criança e do Adolescente (art. 240 do ECA – utilização de criança ou adolescente em cena de sexo explícito ou pornográfica; art. 241 do ECA – comércio de material pedófilo; art. 241-A do ECA – difusão de pedofilia; art. 241-B do ECA – posse de material pedófilo; art. 241-C do ECA – simulacro de pedofilia; art. 241-D do ECA – aliciamento de crianças).4 Portanto, o que fica claro é que o legislador buscou proteger as crianças e adolescentes e, ao mesmo tempo, respeitar a vontade dos adultos capazes.
O profundo desconhecimento das leis e direitos no Brasil por este coletivo vai além. Uma simples leitura da Lei 12.318/2010 mostra que seu objetivo é educar pai ou mãe que cometam atos de alienação parental para que parem de causar sofrimento aos filhos por meio desta violência psicológica. É claro que, caso o genitor continue insistindo nessa prática prejudicial, pode ser afastado para proteger a criança ou adolescente desse mal. Para isso basta dar uma olhada rápida no artigo 6º da Lei 12.318/10.5 Tudo que a lei sugere como forma de proteger a criança é declarar a ocorrência de alienação parental e advertir o alienador (1); ampliar o regime de convivência familiar em favor do genitor alienado, ou afastado (2); estipular multa ao alienador (3); determinar acompanhamento psicológico e/ou biopsicossocial (4); determinar a alteração da guarda para guarda compartilhada ou sua inversão (5); determinar a fixação cautelar do domicílio da criança ou adolescente (6) e declarar a suspensão da autoridade parental (7). Alguém consegue ver como essas medidas podem interferir em algum processo criminal? Para tornar mais óbvio ainda, de que essa lei não interfere em outras ações cíveis ou criminais, segue o caput do art. 6º.
Caracterizados atos típicos de alienação parental ou qualquer conduta que dificulte a convivência de criança ou adolescente com genitor, em ação autônoma ou incidental, o juiz poderá, cumulativamente ou não, sem prejuízo da decorrente responsabilidade civil ou criminal e da ampla utilização de instrumentos processuais aptos a inibir ou atenuar seus efeitos, segundo a gravidade do caso.
Logo, dizer que a Lei da Alienação Parental ou LAP, como as revogacionistas apelidaram, legaliza o incesto é errado e só mostra o desconhecimento desses grupos. Se não têm conhecimento sobre o que falam, merecem credibilidade? E o que dizer de deputadas que dão ouvidos a esses grupos? O que fica cada vez mais claro para quem quiser ver a verdade por trás do discurso desses grupos é que são pessoas que parecem ter cometido Alienação Parental extrema, foram afastadas dos seus filhos para proteção deles e querem a revogação da lei para poder voltar a fazer mal aos filhos. Em outra oportunidade, vou escrever sobre o art 6º da Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro (LINDB), o Decreto-Lei 4.657 de 1942 que diz que a Lei em vigor terá efeito imediato e geral, respeitados o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada. Ou seja, o que foi julgado está julgado e a lei não retroage. As sentenças que protegeram os filhos do convívio tóxico e perigoso com esses pais e mães que hoje lutam pela revogação da lei se manterão, para o bem dessas crianças e da sociedade em geral.
Assim como o gado segue melhor um vaqueiro quando se encanta pelo seu olhar, os seguidores desses coletivos seguem dando coro para a voz errática desses representantes. O que acontecerá quando descobrirem que, ao seguirem por este caminho, a vaca vai para o brejo? Deixo as conclusões para vocês.
Em tempo: todas as referências deste artigo estão com seus link abaixos. Dá uma conferida lá.
Referências
1. Giro Boi. Manejo do gado fica mais fácil quando peão “encanta” o boi com os olhos. Disponível em https://www.girodoboi.com.br/destaques/manejo-do-gado-fica-mais-facil-quando-peao-encanta-o-boi-com-os-olhos/ acessado em 09 de dezembro de 2021.
2. Oxford Languages and Google acessado em 09 de dezembro de 2021 no endereço https://languages.oup.com/google-dictionary-pt/
3. Decreto-Lei 2.848 de 1940 – Código Penal Brasileiro acessado em 09 de dezembro de 2021 em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848compilado.htm
4. Lei 8.069 de 1990 – Estatuto da Criança e do Adolescente acessado em 09 de dezembro de 2021 em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm
5. Lei 12.318 de 2010 acessado em 09 de dezembro de 2021 em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2010/lei/l12318.htm.