Resenha de livro vale mais que vida. Preso sai no Dia das Mães. Inocente não sai nem da acusação.

Quando a vítima não volta e o assassino volta para casa
No Brasil, até quem mata dorme tranquilo. Pode assassinar os próprios pais, mandar sumir com a mãe do seu filho, atirar em alguém pelas costas e sair da prisão anos depois — com direito a visita íntima, resenha de livro e curso técnico de comportamento.
Porque aqui, a liberdade não é um prêmio por arrependimento. É um cronômetro que começa a correr no dia da sentença. E o tempo, no Brasil, sempre corre a favor do criminoso.
Pena de morte? Proibida. Prisão perpétua? Inconstitucional. Regime fechado integral? Inaceitável.
Tudo isso seria “cruel demais”. Já matar os próprios pais com uma marreta ou desaparecer com a mãe do seu filho em uma mala… é tratado como questão de “ressocialização” pelo sistema. Não é a jurisprudência que suaviza o crime — é a própria lei que permite que o tempo, o bom comportamento e uma resenha de livro valham mais que uma vida.
O caso Suzane: matar os pais e sair pela porta da frente
Em 31 de outubro de 2002, Suzane von Richthofen, então com 18 anos, ajudou o namorado Daniel Cravinhos e o cunhado Cristian a assassinar seus pais, Manfred e Marísia, enquanto dormiam. O crime chocou o país pela frieza e premeditação. Em 2006, ela foi condenada a 39 anos e 6 meses de prisão por duplo homicídio triplamente qualificado. Um crime planejado. Frio. Bárbaro. A pena, no papel, era pequena demais. E na prática? Menor ainda.
– Em 2015, obteve a progressão para o regime semiaberto, quase 9 anos após a prisão.
– Em 2019, deixou a prisão temporariamente no Dia das Mães, beneficiada pela saída autorizada pela Justiça.
– Em 2023, foi libertada em definitivo, após cumprir 20 anos com progressões, remições e benefícios.
Hoje, é empresária. Casada. Cursa Direito. Reabilitada pelo Estado. Enquanto isso, os pais continuam mortos. E quem questiona o sistema, é chamado de “punitivista”.
Mesmo quem matou a própria mãe é autorizado a sair no Dia das Mães. Foi o que aconteceu com Suzane von Richthofen. E não foi a única. Anna Carolina Jatobá também foi autorizada a deixar a prisão no Dia das Crianças. No Brasil, o calendário vale mais que o crime.
O caso Nardoni: matar a filha e voltar à rotina
Em 29 de março de 2008, Isabella Nardoni, de apenas 5 anos, foi jogada do 6º andar do Edifício London, na zona norte de São Paulo. O crime chocou o país e rapidamente levantou suspeitas contra o pai, Alexandre Nardoni, e a madrasta, Anna Carolina Jatobá.
Em março de 2010, ambos foram condenados por homicídio triplamente qualificado e fraude processual: Alexandre a 31 anos, 1 mês e 10 dias de prisão; Anna Carolina a 26 anos e 8 meses.
– Em julho de 2017, Anna Carolina Jatobá obteve a progressão ao regime semiaberto e, em outubro daquele ano, deixou a prisão beneficiada pela saída temporária no Dia das Crianças.
– Em agosto de 2019, Alexandre Nardoni saiu da prisão temporariamente no Dia dos Pais.
– Em maio de 2024, Alexandre obteve progressão para o regime aberto após 16 anos de prisão.
Não é piada. É a Lei de Execução Penal brasileira. O crime perde sentido. A pena vira rito. E a vítima… essa some da memória coletiva. Afinal, o criminoso já “pagou sua dívida com a sociedade”.
O caso Bruno: sumiu com o corpo e voltou como celebridade
Em junho de 2010, Bruno Fernandes, então goleiro do Flamengo, foi preso suspeito de envolvimento no desaparecimento de Eliza Samudio, com quem teve um filho. Segundo as investigações, ele participou do sequestro, foi omisso na execução e ocultou o cadáver, que nunca foi encontrado. Em 2013, foi condenado a 22 anos e 3 meses de prisão por homicídio triplamente qualificado, sequestro e ocultação de cadáver.
– Em fevereiro de 2017, foi libertado temporariamente por decisão monocrática do ministro Marco Aurélio Mello, do STF, por meio de um habeas corpus.
— A decisão foi revogada pela Primeira Turma do STF em abril do mesmo ano, e ele retornou à prisão.
– A progressão definitiva para o semiaberto foi concedida em julho de 2019, pela 1ª Vara Criminal e de Execuções Penais de Varginha (MG).
– Em janeiro de 2023, Bruno obteve liberdade condicional concedida pela Justiça do Rio de Janeiro, após cumprir requisitos legais e apresentar bom comportamento.
Mesmo durante a liberdade temporária de 2017, assinou contrato com o Boa Esporte Clube, de Minas Gerais, gerando protestos e perda de patrocinadores. Desde a liberdade condicional, voltou a atuar por times amadores: passou pelo União do Bom Destino (ES), EC Betel (MG) e, em maio de 2025, foi anunciado como novo jogador do Azul e Branco Futebol Clube, da cidade de Búzios (RJ), com contrato até o fim do ano.
Porque no Brasil, matar uma mulher pode sair mais barato do que contrariar uma.
A engenharia jurídica da impunidade
O Código Penal e a Lei de Execução Penal brasileiras formam uma engrenagem complexa que, na prática, protege o criminoso com zelo quase maternal — e tudo dentro da legalidade.
Para o brasileiro médio, que acredita que uma condenação significa cumprir a pena até o fim, a realidade é um choque:
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Artigo 75 do Código Penal: ninguém pode cumprir mais de 40 anos de prisão, mesmo que tenha matado 5, 10 ou 15 pessoas. A pena pode ser maior no papel, mas nunca na prática.
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Progressão de regime: o condenado começa em regime fechado, mas pode ir para o semiaberto após cumprir 16%, 25%, 40% da pena — a depender do crime, da reincidência e da colaboração com a Justiça. Para isso, basta manter “bom comportamento”.
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Remição de pena: a cada 3 dias de trabalho, estudo ou leitura aprovada, 1 dia é abatido da pena. Na prática, isso antecipa ainda mais a liberdade.
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Saídas temporárias: datas como Páscoa, Dia das Mães, Dia dos Pais, Natal e Ano Novo garantem ao preso do semiaberto o direito de visitar a família — mesmo que tenha destruído a própria.
Esses benefícios não são exceções. São garantias legais. E o sistema não mede o dano causado — apenas o desempenho do réu dentro das regras do próprio jogo jurídico.
Na prática, funciona assim:
Imagine um condenado a 30 anos de prisão por um crime brutal. Se for primário, se mantiver bom comportamento e participar das atividades na prisão, ele poderá:
– Cumprir apenas 12 anos em regime fechado antes de ir para o semiaberto;
– Reduzir de 2 a 3 anos da pena com leitura, trabalho e cursos;
– Aproveitar até 5 saídas temporárias por ano, mesmo condenado por homicídio;
– Cumprir o restante da pena em casa, comparecendo mensalmente ao fórum para assinar presença e comprovar endereço.
Enquanto a sociedade ainda acredita que pena é castigo, o sistema vê a pena como uma espécie de processo educacional. Quanto mais rápido o réu aprende a se comportar, mais cedo volta pra rua.
E se não aprender?
Basta fingir que aprendeu.
E o inocente?
Esse não tem progressão. Não tem remição. Não tem visita íntima. Não porque não mereça — mas porque não está sequer em cumprimento de pena. Está preso por algo ainda pior: uma acusação. E isso, no Brasil, pode ser mais devastador do que uma condenação.
O inocente perde a liberdade antes mesmo da sentença. Perde a carreira. O nome. O CPF limpo. A confiança na Justiça. Não há benefício algum por ser inocente. Nenhum crédito. Nenhuma cautela institucional. Nenhuma presunção a seu favor.
– Não há benefício para quem sofre uma denúncia falsa.
– Não há indenização moral proporcional.
– Não há reconstrução de imagem promovida pelo Estado.
E por quê? Porque o processo, por si só, já é uma sentença. Ser acusado — mesmo sendo inocente — significa abrir mão da paz, da vida profissional, da liberdade de expressão e, muitas vezes, da própria segurança. Significa pagar caro para se defender, enquanto o acusador é amparado por advogados públicos, ONGs, mídia e ideologia.
Significa viver sob suspeita por anos, tentando provar o que não fez — enquanto quem mente sequer precisa sustentar o que diz. Significa carregar um processo como se fosse uma marca, uma culpa sem crime, uma pena sem condenação.
Enquanto o condenado tem progressão, remição, assistência jurídica e reinserção planejada, o inocente tem só o trauma, o prejuízo e o esquecimento.
O inocente é punido antes, durante e depois. O culpado, só até aprender as regras do sistema.
Por que a lei protege tanto o culpado?
Porque foi feita para isso. A Constituição de 1988, redigida sob o trauma da ditadura militar, criou um sistema penal garantista — só que desequilibrado. O medo de repetir abusos do passado virou pavor de punir qualquer criminoso. E o resultado foi um sistema que não pune com justiça, pune com culpa — culpa do Estado, culpa da sociedade, culpa de quem ousa exigir rigor.
As faculdades de Direito passaram a formar juristas que não enxergam mais o crime como responsabilidade individual, mas como reflexo social. O réu virou vítima. Vítima da sociedade. O delito virou sintoma. O castigo virou tabu. E o sistema, cada vez mais ideológico, passou a tratar o criminoso como um fracasso coletivo — e a vítima como um dano colateral inevitável.
Quem estuda Direito hoje aprende a desconfiar da punição, a duvidar da repressão penal, a evitar a prisão a todo custo — mesmo que o custo seja a impunidade. Nesse cenário, exigir justiça virou sinal de atraso. Pior: virou pecado ideológico.
A lei protege tanto o culpado porque o sistema não vê mais o crime como problema. Vê como consequência. E como toda consequência tem uma causa anterior, o criminoso vira alguém a ser compreendido — e a vítima, alguém a ser esquecida.
Enquanto o mundo endurece, o Brasil afrouxa
O Brasil tenta imitar os sistemas penais de países com baixíssimas taxas de criminalidade — mas ignora que nesses lugares a própria lei é branda porque quase não há crime. Não é que o sistema funcione apesar da pena curta. Ele funciona porque o crime é exceção. Aqui, tentamos aplicar os mesmos princípios num país tomado por impunidade, violência e reincidência. Resultado: um modelo importado de fora, descolado da realidade brasileira, que só beneficia quem mais a agride. Adota-se o discurso da reabilitação, mas não se exige mudança de conduta. Promete-se reintegração, mas se esquece da reparação.
Em contraste, países com altos índices de criminalidade no passado — e que enfrentaram guerras, terrorismo e crises institucionais — optaram por endurecer suas leis penais para conter a violência:
– Nos Estados Unidos: prisão perpétua e pena de morte.
– Na África do Sul: prisão perpétua.
– Na Indonésia e China: execução para crimes graves.
No Brasil:
– O bandido estuda na prisão para sair mais cedo.
– Escreve resenha para reduzir pena.
– Faz live quando volta para o semiaberto.
Tudo em nome da “ressocialização”. Uma ressocialização que nunca considera a vítima, a família destruída, e a sociedade aterrorizada.
Aqui, o crime compensa. E a inocência custa caro.
No Brasil, não é o criminoso que deve temer o Estado. É o cidadão comum. O trabalhador. O pai de família. O policial que reage. O professor que se posiciona. O homem que ousa enfrentar uma acusação infundada.
Porque aqui, quem destrói vidas tem direito à reabilitação. Mas quem exige justiça é chamado de radical. Quem pede punição é tachado de autoritário. Quem se defende é acusado de violência institucional.
Essa não é uma falha do sistema. É o próprio sistema funcionando exatamente como foi desenhado: para proteger quem infringe, punir quem resiste e silenciar quem denuncia.
E se você acha que isso ainda é exagero… espere até que a próxima vítima tenha seu sobrenome. Ou o rosto do seu filho. Ou o nome do seu pai no Diário Oficial, como réu de um processo que nunca deveria ter existido.
O Brasil precisa ter uma nova constituinte
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